“Eu queria falar da minha gente, do meu povo, da minha cultura. Do cotidiano do meu povo. Apesar de tudo que a gente sofre aqui no Nordeste, eu tenho um amor danado por essa terra e por essa gente.” – Fernandes Rodrigues.
História de vida
Fernandes Rodrigues de Oliveira (1963) nasceu no Engenho Cacimbas, na zona rural de Vitória de Santo Antão – PE. Seu pai tinha um comércio no engenho chamado barracão, onde eram vendidos mantimentos e outros produtos. Quando era criança, gostava de frequentar a casa dos agricultores à noite para ouvi-los ler cordéis. Apesar de frequentar a escola, Fernandes aprendeu a ler assim, com as letras e rimas dos cordelistas. Como outras tantas crianças que crescem no interior, adorava brincar com o barro, modelando figuras para serem seus brinquedos.
Trabalhou por muito tempo como montador em lojas de móveis, mas não via muita perspectiva nessa profissão e sentiu a necessidade de mudar. Em 1989, decidiu trabalhar com o que gostava, fazendo arte. Na época, aceitou o convite de um amigo para trabalhar fazendo alegorias para os tradicionais blocos de carnaval. Para a confecção das alegorias, utilizava a técnica do papel machê, tendo como molde uma escultura de barro, o que acabou reestabelecendo seu contato com essa matéria-prima.
Com o enfraquecimento da cultura dos carros alegóricos em Vitória de Santo Antão, que estavam sendo substituídos por trios elétricos, precisou encontrar uma nova ocupação. Em 1997, descobriu que Mestre Zezinho de Tracunhaém estaria em Vitória de Santo Antão, onde nasceu, para ministrar um curso de cerâmica a convite da prefeitura. Decidido a conhecer mais a ciência do barro, procurou o mestre para ser seu aluno.
Junto com os ensinamentos, tornaram-se amigos. Como Mestre Zezinho não sabia ler e escrever, Fernandes passou a atuar como uma espécie de secretário, auxiliando-o em suas atividades. Um dia, ao acompanhar Mestre Zezinho em uma entrevista para dar aulas de cerâmica para os internos da antiga FUNDAC, atual FUNASE – Fundação de Atendimento Socioeducativo, a diretora da instituição acabou gostando de Fernandes, que deu oficinas de cerâmica para os jovens por pouco mais de três anos.
Após esse período, decidiu dedicar-se ao seu ateliê, complementando sua renda com a realização de consertos de para-choques de carro e caminhão. Paralelamente, começou a apresentar seu trabalho em feiras especializadas de artesanato, tornando-se cada vez mais reconhecido.
Apresenta suas peças na Fenearte – Feira Nacional de Negócios do Artesanato desde 2004, mas foi em 2016 que participou pela primeira vez em espaço de honra, na Alameda dos Mestres. Dentro da programação da Fenearte, no Salão de Arte Popular Ana Holanda, foi premiado em 2013 por voto popular, em 2018 ficou em primeiro lugar e em 2019 ganhou Menção Honrosa.
Obra e processo criativo
Fernandes Rodrigues esculpe no barro, com grande maestria, personagens da cultura nordestina. Alguns são anônimos, como vaqueiros, trabalhadores e músicos. Outros são famosos, como Ariano Suassuna, Paulo Freire e Patativa do Assaré. Cria esculturas de dimensões menores e domina a produção de grandes formatos – até mesmo em tamanho natural – e bustos. Algumas de suas peças podem ser vistas em espaços públicos de Pernambuco, como monumentos.
Tem predileção por modelar figuras masculinas, principalmente sentadas. Algumas parecem apenas pousar, enquanto outras estão concentradas em alguma atividade, como tocar viola, pífano, sanfona e rabeca ou lendo livros. Seus personagens trajam roupas simples, mas podem portar chapéu e gibão de vaqueiro. São representados de pés descalços, uma marca do artista, para lembrar a simplicidade do povo nordestino.
As peças não recebem nenhum tipo de pintura, pois Fernandes prefere respeitar a naturalidade e a nobreza do barro. Seu trabalho chama a atenção pelo realismo e expressividade dos personagens, que parecem estar vivos. Gosta de observar os traços das pessoas, sua fonte de inspiração:
“Minha mente é fértil. A minha função é prestar atenção na natureza. Eu presto muita atenção nas pessoas. Eu olho pra uma pessoa e não vejo a cor da roupa, pode perguntar que eu não sei. Mas eu sei como é a boca, como é o nariz, principalmente os olhos. Eu observo muito nas pessoas os olhos. Quando olho pra pessoa, pelos olhos eu sei como a pessoa é. Por conta disso eu procuro fazer bem os olhos.”
Apesar do trabalho minucioso e da grande atenção aos detalhes fisionômicos, nega qualquer intenção de reproduzir fielmente a realidade:
“Não sai perfeito, eu não procuro fazer exatamente como é. Procuro fazer do meu jeito, eu não quero imitar e fazer uma pessoa igual. Procuro fazer de um jeito que chame a atenção do espectador. Eu não quero fazer uma peça para explicar que eu quis dizer isso ou aquilo. A escultura é que vai dizer para o espectador, não eu. Ele vai se emocionar, pode até achar feio, mas ele se emocionou, a peça causou uma reação nele e é isso que eu procuro.”
Possui um ateliê na rodovia BR-232, onde recebe aprendizes que, de tempos em tempos, passam um período aprendendo com ele. Coleta o próprio barro em um barreiro da cidade e o prepara com o auxílio de máquinas. Adaptando um projeto de forno elaborado por universitários, construiu seu forno de chama invertida, conferindo uma queima de mais qualidade e durabilidade para suas peças.
Referências
As citações de Fernandes Rodrigues foram retiradas de uma entrevista realizada por Isabel Franke no dia 01 de maio de 2024.