Din Alves – CE

História de vida

Aparecido Gonzaga Alves (1985) nasceu e cresceu em Juazeiro do Norte, Ceará. Era chamado de Cidinho por sua família, os conhecidos do bairro começaram a chamá-lo de Din e o apelido foi ficando. Passou a infância inteira no mercado, onde sua mãe trabalhava vendendo verduras. Quando era bebê, ficava em uma banheira de plástico, acompanhando a mãe no trabalho. Para ajudar com a renda da família, começou a trabalhar no chapeado ainda criança, descarregando caixas de frutas e verduras que chegavam para ser vendidas. Não completou os estudos, frequentou a escola até a quarta-série.

Din vem de uma reconhecida família de artistas. Seu avô Pedro Luiz Gonzaga era xilógrafo, assim como seu primo José Lourenço. Por isso, desde a infância Din admirava como os cordéis eram feitos na Lira Nordestina, uma das mais antigas editoras especializadas na produção de cordéis do Brasil.

Morava no bairro Boca das Cobras, considerado um celeiro de artesãos. Começou a trabalhar no entalhe com 13 anos como ajudante, lixando peças. Geralmente lixava imagens de São Francisco e santos. Passou a entalhar peças menores, como as mãos, cajados e pombos das imagens dos santos, que eram encaixadas nas obras de outros artesãos. Depois fez cobras de madeiras até que começou a fazer os santos por inteiro. Lembra que no começo de sua trajetória era “uma tristeza” porque ninguém queria comprar as peças, pois estavam feias e mal feitas.

Ainda jovem foi trabalhar no Centro de Cultura Popular Mestre Noza, onde ficou por 18 anos. Foi vice-presidente, vice-tesoureiro e secretário. Por seu envolvimento nas diferentes atividades de coordenação da associação que faz a gestão do Centro de Cultura Popular Mestre Noza, teve importante papel na articulação dos artesãos e no desenvolvimento de parcerias. Também possui forte atuação na formação de novas gerações de entalhadores, compartilhando seus conhecimentos com os aprendizes. Foi um dos organizadores da produção dos artesãos que participaram da exposição Raiz do artista Ai Weiwei, realizada na cidade de São Paulo em 2018. Na capa do catálogo da exposição, a mão em madeira fazendo o gesto cotoco é de sua autoria.

Din saiu do Centro de Cultura Popular Mestre Noza em 2020 para abrir um espaço de comercialização independente com outros artesãos, entre eles Everaldo. O local se chama Casa de Três Marias Cariri.

Um momento marcante para Din é a participação na novela A Lei do Amor (2016 – 2017), integrando o acervo da fictícia galeria de arte popular da trama. A curadoria das peças para a novela foi realizada por Marco Aurélio Pulchério, sócio da Marco500 e curador desta primeira edição do Arte dos Mestres. Ao enquadrar as peças como arte popular, a novela projetou para um público amplo a criação de diferentes artistas brasileiros, promovendo um novo status para essas obras no circuito da arte. No último episódio da novela, Din e outros artesãos atuaram como figurantes. O acervo da galeria do enredo foi incorporado, em sua quase totalidade, pelo CRAB – Centro Sebrae de Referência do Artesanato Brasileiro, localizado no Rio de Janeiro.

Obra e processo criativo

Din Alves cria principalmente imagens de personalidades, como Luiz Gonzaga, e outras relacionadas à cultura do nordeste, como personagens da cultura e de festas populares. O reisado e peças que representam cenas de romaria, como os paus de romeiros e os paus de arara, destacam-se entre suas criações.

Desenvolveu um estilo próprio para representar personagens: atarracados e gordinhos, foram agradando as pessoas a ponto de ser reproduzido por outros artesãos. Criou esse tipo de representação sem pensar muito, quando entalhava uma Nossa Senhora que saiu gordinha e baixinha. As peças que produzidas na sequência nasciam cada vez mais baixinhas e gordinhas e, assim, aperfeiçoou seu estilo.

Utiliza as madeiras umburana, cedro e louro-rosa e entalha com ferramentas manuais. A motosserra e a lixadeira são utilizadas apenas para peças maiores. Faz a maior parte do processo de criação, mas sua esposa e filhas trabalham pintando. Conta que geralmente se reúnem à noite para pintar em casa, quando fazem a atividade assistindo televisão.

As romarias em Juazeiro do Norte

Juazeiro do Norte é a cidade mais importante da região do Cariri cearense. É um polo econômico, com várias fábricas (calçadistas) e grandes mercados de atacado, além de ser um polo educacional, concentrando várias instituições de ensino superior.

É o maior centro de peregrinação e romaria na região nordeste e é um dos maiores polos de fé católica do Brasil, como Belém do Pará e Aparecida, em São Paulo. Ao longo do ano, são realizadas pelo menos 10 romarias, sendo a de Finados a que mais atrai romeiros de toda a região e de outras partes do Brasil. Essa romaria recebe, há alguns anos, pelo menos 500 mil pessoas. Outras são dedicadas à Nossa Senhora das Dores e ao Padre Cícero.

Tradicionalmente, o pau de arara, um caminhão de carga adaptado com tábuas para o transporte de pessoas, era utilizado pelos romeiros que chegavam à cidade.  Desde 2014, a circulação de caminhões pau de arara para transporte de romeiros entre estados está proibida, de acordo com a norma Nº 508/2014 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Essa proibição gerou um intenso debate na região. A proibição deve a falta de segurança dos passageiros, que ficam muito expostos a acidentes. Por outro lado, para alguns religiosos, a utilização de pau de arara para o transporte de romeiros é uma tradição, envolvendo uma multiplicidade de significados.

De acordo com esses fiéis, a romaria em pau de arara produz um ambiente de mística que é compartilhado por todos os romeiros, transformando cada momento da viagem em algo carregado de significado religioso. O desconforto do transporte é entendido como uma penitência, o compartilhamento do preparo das refeições representa a comunhão, as pessoas compartilham rezas e outras práticas ao longo do caminho. 

Com a proibição e o uso dos ônibus, muitas pessoas entendem que a romaria deixou de ter caráter religioso e passou a ser um evento turístico. Por isso, há um movimento que busca retomar o pau de arara. O Projeto de Lei nº 3643/2015, que segue aguardando consideração do Senado, “declara a tradição do uso do transporte conhecido como “pau de arara” para a realização de romarias religiosas, como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil”. O projeto de lei prevê a adaptação do meio de transporte para que ele seja seguro para os passageiros.

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