Jasson – AL

História de vida

Jasson Gonçalves da Silva (1954) vive na zona rural do município de Belo Monte, Alagoas. Trabalhou na roça desde criança, cultivou e ainda cultiva milho, feijão, algodão e cria pequenos animais. Por volta dos 20 anos, mudou-se para Camaçari – BA, onde ficou por cerca de 15 anos. Nesse período trabalhou na construção civil como servente de pedreiro, foi soldador, carpinteiro, entre outras atividades. Também trabalhou em uma fábrica cerâmica de pré-moldados, criando peças que seriam reproduzidas por meio de moldes de gesso. Como carpinteiro, produziu muitos móveis, como bancos, cadeiras, mesas, entre outras peças.

Ao retornar para Alagoas, tentou sem sucesso continuar a produção de peças de cerâmica, pois o barro disponível na região é apropriado. Voltou a trabalhar na roça, cultivando e produzindo leite, além de prestar serviço de mecânico para consertar arados e maquinários agrícolas para agricultores da região.

Em 2012, recebeu a visita de Maria Amélia Vieira e Dalton Costa, casal proprietário da Galeria Karandash em Maceió e que viajavam pela região do Baixo São Francisco em busca de artistas populares. O casal sugeriu que Jasson fizesse esculturas de madeira, e seguindo o conselho, Jasson esculpiu um casal de bonecos que saiu à semelhança de imagens religiosas. 

Por trabalhar na roça, Jasson tinha intimidade com a madeira, ainda que desconfiasse de sua capacidade de produzir arte em um primeiro momento. No trabalho diário no campo, é preciso cortar galhos caídos, confeccionar ferramentas, cercas e carros de boi. Jasson diz que já tinha o conhecimento para lidar com a madeira, mas a capacidade de produzir arte é inata, um dom recebido: “vim aprendido, graças a Deus”.

A partir do contato com os galeristas, Jasson foi se inserindo em um contexto artístico fortemente influenciado pela arte produzida na Ilha do Ferro, que fica a cerca de 40 km de Belo Monte. Em 2015 participou do projeto Encontro de Mestres, interagindo com Aberaldo Sandes, Petrônio Farias, Valmir Lessa, Zé de Tertulina e Chico Cigano. Em 2016, participou do projeto “Afluentes”, desenvolvido pelo Grupo Design Armorial apoiado pela Universidade Estadual de Alagoas. O projeto tinha como objetivo criar peças a partir do design participativo, unindo os artistas populares e designers. Nesse projeto, Jasson co-criou com Dalton Costa duas luminárias e a instalação “Pássaros do sertão”, que integraram uma exposição realizada em São Paulo e dedicada a apresentar os resultados do projeto.

A partir da interação e contato com a estética da arte popular da Ilha do Ferro, e entendendo o prestígio e o reconhecimento que as peças produzidas na região tinham no circuito de arte popular, Jasson sentiu a necessidade de se dedicar a criar sua própria linguagem. Nesse esforço criativo de encontrar sua própria voz artísticas, nasceram suas cadeiras ricamente ornamentadas, malas, carrancas, esculturas de árvores e outras esculturas.

O reconhecimento e a circulação do trabalho de Jasson tomaram novo fôlego com a visita de Renan Quevedo, pesquisador e comunicador do projeto Novos para Nós, em 2018. Renan abriu caminhos e facilitou o contato de Jasson com galeristas e outros consumidores. Suas peças participaram de exposições, como a do Festival Criativos por Tradição realizado pela Artesol entre 2018 e 2019 no Rio de Janeiro. E alcançou projeção internacional por meio da participação na Mostra Be Brasil, no Fuorisalone da Semana de Design de Milão (2019), produzida pela Marco500.

Em 2021 recebeu o Prêmio Gustavo Leite de Artista Popular do Museu Théo Brandão. No mesmo ano aconteceu a exposição O sol nasce para todos, realizada pelo Museu, pela Companhia Brasileira de trens Urbanos e pelo Projeto Novos para Nós, inteiramente dedicada ao artista.

Obra e processo criativo

Jasson é inquieto, acorda antes do sol nascer. Diz que quem dorme pouco vive melhor a vida. Cria peças únicas esculpidas em madeira, que podem ou não receber pintura. Por vezes agrega à madeira outros elementos, como cordas e cerâmica industrial. Algumas peças, como as carrancas e cajados, possuem entalhes espiralados que remetem à roda e fuso da casa de farinha, atualizando suas lembranças de infância, pois seu avô era mestre no entalhe dessas peças.

A partir das sugestões de pessoas do circuito da arte popular, Jasson cria suas obras justapondo elementos que não são imediatamente óbvios para gerar curiosidade em quem observa. Essa lógica inusitada de combinações de formas, temas e cores levaram o trabalho de Jasson a ser caracterizado pela crítica como “fantástico sertanejo”, dialogando com o imaginário popular nordestino, que também se manifesta na literatura, na música e no teatro.

Além de se inspirar na natureza que o cerca, como as flores coloridas e exuberantes da caatinga, Jasson costuma sonhar com as peças, ou imaginar o que quer criar durante a noite. Ele não faz esboços e não marca a madeira com lápis para iniciar os trabalhos. Imagina a peça e “desenha com a ferramenta”, por meio do entalhe. 

Não corta árvores para produzir suas peças, utilizando galhos e madeiras caídos coletados em sua região, muitas vezes trazidos pelos rios. E não utiliza parafusos nem pregos, apenas pinos de madeira para a montagem das peças.

Muitas vezes mobiliza a própria forma tortuosa da madeira para dar vida a novos seres e objetos. Os galhos retorcidos são característicos das árvores da caatinga, como timbaúba e imburana, carregando ainda mais suas peças de significado simbólico. 

Jasson, observador atento, diz que a madeira é viva, basta prestar atenção. Ela mesma explica como quer se transformar.

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