Willi De Carvalho – SP

História de vida

Welivander César de Carvalho (1966) nasceu e cresceu em Montes Claros, Minas Gerais.  Foi uma criança criativa e bagunceira, envolvia os primos e amiguinhos em brincadeiras inventadas, como carnavais de rua, teatros e desfiles. 

Estudou no Conservatório de Música de Montes Claros, o que teve um impacto profundo em seu olhar artístico. Gostava muito de desenhar e tinha vários cadernos, que sua mãe guardou com carinho e continuam bem conservados.  Autodidata, pintava telas e começou a trabalhar em escolas de teatro e de arte fazendo cenários para espetáculos, figurinos, maquiagens artísticas, além de atuar. Em 1993 fazia parte de um ateliê com amigos e entrou para a companhia de teatro Fibra, que existe até hoje. O grupo apresentava um musical chamado Brincando de brincar, com o repertório formado por músicas populares de domínio público de Minas Gerais. Para Willi, foi trabalhando com essas músicas que adquiriu conhecimentos para se tornar o artista que é hoje. 

Montes Claros faz parte do sertão mineiro, descrito por Guimarães Rosa em seus livros. É muito rica culturalmente, com manifestações populares como marujadas, caboclinhos e catopés. Essas manifestações caracterizam-se pela origem religiosa católica e popular, com fortes traços das culturas africanas dos negros escravizados. Nessas folias, os celebrantes desfilam, cantam e dançam pela cidade em homenagem aos santos, como São Benedito, o Divino Espírito Santo e a Nossa Senhora do Rosário, especialmente venerados pela população negra desde o Brasil Colônia. É interessante notar que os celebrantes utilizam trajes ricamente adornados, com pedrinhas coloridas e muitas fitas, estética que será incorporada por Willi em seus trabalhos.

Quando trabalhava na criação de cenários para o teatro, Willi tinha como a prática criar o cenário em miniatura, como uma forma de planejamento e visualização dos elementos no espaço. Em 1997 acontece uma virada em sua carreira, quando a miniatura deixa de ser uma ferramenta e passa a ser definitivamente sua linguagem como artista. Nesse ano aconteceu um encontro artístico em Montes Claros, o Psil Poético. Em sua participação no evento, o artista curitibano Hélio Leites se apresentou com um figurino singular, uma roupa que possuía um teatrinho de caixa de fósforo, com partes que se abriam, revelando as peças e personagens escondidos. Willi ficou maravilhado, pois nunca havia imaginado que a miniatura poderia ser uma possibilidade de produção genuinamente artística. 

A partir dessa descoberta começou a fazer obras em caixinha de fósforo para ele mesmo e para vender para pessoas próximas. Suas obras foram caindo no gosto de um púbico cada vez mais amplo. Quando começaram a ser estampadas em revistas de decoração, sua trajetória teve mais um ponto de virada. Suas criações foram reconhecidas como obras de arte, hoje estão em galerias de arte popular e atraem principalmente colecionadores. Willi participou de diversas exposições individuais e coletivas e também ganhou vários prêmios.

Willi foi casado com a artista Clélia Lemos por 20 anos. Os dois se conheceram trabalhando juntos na produção de cenários e figurinos para espetáculos.  Clélia foi uma importante companheira para a construção de sua carreira artística. Mulher determinada e de pé no chão, auxiliava na pesquisa de referências, na confecção das peças e na comercialização. Também foi com ela que Willi começou a dar oficina de estandartes.

Em 2019, Willi foi contatado pelo carnavalesco da Escola União da Ilha do Governador, para contar que seu trabalho inspirou toda uma ala e convidá-lo a criar um carro alegórico. O tema do samba-enredo daquele ano era a cultura do Ceará e Willi criou o croqui do carro intitulado “Procissão Marítima de São Pedro” em apenas duas semanas e ficou muito emocionado ao desfilar na avenida em sua própria obra.

Obra e processo criativo

Willi não tem estudo formal em arte. Com grande talento, aprendeu na prática, convivendo e trabalhando em companhias de teatro. 

Suas obras retratam elaboradas cenas em miniatura, em que cada personagem tem seu lugar e um papel para contar uma história como se estivessem em um palco de teatro. Seus mundos em miniatura retratam temas e personagens populares: danças populares, favelas, festas folclóricas e temas religiosos…

Trabalha com técnica mista, utilizando principalmente materiais reutilizados. Os personagens são feitos com madeira, arame e porcelana fria. Para o cenário, geralmente usa madeira, papel panamá e modela as formas com papietagem. Com arames, cria ornamentos que têm a função de produzir movimentos para a cena. Também utiliza fitas e pedrarias. 

Começa a criar pelo desenho, desenhando na mente, mas principalmente no ar. Quando a inspiração aparece e se concretiza, faz desenhos em cadernos. Desenha no papel, faz anotações, como um desenho de cenário de teatro, onde cada elemento deve ficar no seu lugar de atuação. Depois de desenhar, inicia o processo de construção das miniaturas.

Para estimular a criatividade, lê livros de arte e de literatura brasileira, especialmente as obras de Guimarães Rosa e Ariano Suassuna. Criou uma série de obras inspiradas pelos livros de Suassuna, o que lhe trouxe a oportunidade de conhecer o escritor. Dedica-se a um intenso trabalho de pesquisa, buscando referências e informações que podem ser agregadas às suas peças.

Dentre os elementos que utiliza, gosta especialmente da pomba, pois remete ao Espírito Santo tão presente em sua infância. A Igrejinha dos Morrinhos, coo é conhecida a Capela do Senhor do Bonfim, marco arquitetônico de Montes Claros, também aparece em várias de suas obras. Foi nessa igreja que seus pais se conheceram e, por isso, possui para Willi um significado especial.

Willi de Carvalho é considerado um dos maiores miniaturistas do Brasil. Seu trabalho é interpretado pela crítica de diferentes formas: como arte popular, arte naif, com características do barroco e da arte contemporânea. Willi, de forma resolutiva, se auto identifica como artista popular.

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